quarta-feira, 20 de julho de 2016

A vida dá voltas, já sabes...

Lembras-te quando éramos miúdas e eu não fazia nada de jeito a desporto? Tu pedalavas de bicicleta sem te cansares, muito mais rápido e eu, 10 minutos depois de começar, só pedia para parar, já com os pulmões a arder. Lembras-te quando jogavas à bola com o meu pai, desportista nato, e nem te preocupavas em me incluir? Lembras-te quando te rias de mim por me estar sempre a cansar com tudo? Se calhar não fazias por mal, os miúdos são mesmo assim, competitivos, mas eu lembro-me bem do que era sentir-me, no desporto, uma patinha bem feia ao pé de ti, um zero à esquerda, uma grande nódoa de cerejas, chocolate e velas. Não fazias por mal, mas não te custava nada evidenciar o teu domínio e a minha falta de jeito e resistência. Tal como não te custava nada guardares as tuas bolachas de chocolate, aquelas que os avós traziam de Espanha, enquanto me pedias para partilhar as minhas, e eu, partilhava porque sou assim e sempre serei, tal como tu, sempre assim serás. Tu, de quem já ouvi comentários que tiveram tanto de inconveniente como de despropositados, a roçar o cruel. Como sou mais nova, não sei se já te deste conta que és, e serás sempre, mais velha, e durante muito tempo te idolatrei, nunca te respondia à letra, mas as cicatrizes foram-se acumulando até me acordarem, por isso até vi os teus olhos a rodarem no seu eixo quando levaste a  resposta que merecias há muito. E, há uns meses, desafiei-te para uma corrida, foste parva em aceitar, mas ainda tinhas a memória da menina que nunca ganhava nada. Ontem ganhei-te, não, arrasei-te, mostraste cansaço depois de uns bons minutos e eu continuei, fresca, a sentir-me vingada, a levitar numa sensação de justiça, passados mais de 20 anos. 

Nem sei se és boa pessoa ou não, não és autêntica e assim não me permites conhecer-te, apesar de todas as experiências em conjunto, apesar de toda a família em conjunto. Posso até estar errada, podes ter evoluído, mas tu não mostras quem és e eu não me sinto confortável com pessoas assim. Agora até me tratas como se a minha opinião fosse mais importante do que a tua, mas essa atitude não me comove, não me amacia, nem a quero, nunca gosto de me colocar, nem que me coloquem, numa posição superior, porque é falso. Tudo isso é falso! No pouco tempo que estamos juntas conseguimos conviver bem, mas nunca me entrego, sinto-me sempre fora da minha pele, detesto não conseguir ser natural, mas contigo quebrou-se o encanto há muito. Mas sabes, não deixo de gostar de ti, o gostar que nasce no berço, como o nosso, dificilmente se apaga e não houve nada de realmente grave para tal acontecer, mas não venhas querer ganhar-me na corrida...

4 comentários:

  1. Muito bom :)

    (talvez, só talvez, ela tenha mesmo mudado com a vida...)

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  2. Pode ser que ela tenha mudado genuinamente, nunca se sabe.. esperemos que sim!
    Beijinhos

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    1. Diz o ditado que quem nasce torto... mas pode ser que não, que ela se tenha endireitado, eu ainda não consigo concluir nada. Beijinhos :)

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